Gerenciamento de Riscos em Paradas Complexas: A Previsibilidade Alcançada por Simulações Probabilísticas

Gerenciamento de Riscos em Paradas Complexas: A Previsibilidade Alcançada por Simulações Probabilísticas

Autor: Leonardo Barros Engenheiro Civil, Engenheiro Civil III / Contrato Petrobras Montagem – Rio de Janeiro

Resumo:
Este artigo explora a importância do gerenciamento de riscos em paradas complexas, abordando desde os fundamentos teóricos até a aplicação prática de simulações probabilísticas. Serão apresentados casos reais de sucesso onde a gestão proativa de riscos resultou em otimização de prazos e custos, demonstrando como essa metodologia é crucial para a previsibilidade, segurança e eficiência operacional em grandes empreendimentos e processos críticos.

1. Introdução
As paradas complexas — sejam elas para manutenção, comissionamento ou startups de grandes plantas e infraestruturas — representam momentos cruciais e de alta criticidade na vida de um projeto ou ativo operacional. Embora essenciais para garantir a performance e a longevidade dos equipamentos, esses eventos são intrinsecamente carregados de incertezas e riscos significativos, que podem comprometer o retorno à produção, atrasos onerosos, estouros de orçamento e, em casos extremos, acidentes. A interconectividade e a alta interatividade entre as múltiplas interfaces (stakeholders, sistemas, equipes) nessas operações geram uma rede de dependências onde a falha ou o atraso em um ponto pode se propagar rapidamente, magnificando o impacto geral.
É nesse cenário que o gerenciamento de riscos se estabelece não apenas como uma boa prática, mas como um pilar estratégico indispensável para assegurar a previsibilidade, a segurança e o sucesso financeiro dessas empreitadas. Este artigo tem como objetivo contextualizar a relevância do tema e compartilhar o problema da falta de previsibilidade, motivando a necessidade de uma gestão de riscos robusta e baseada em dados concretos.

2. Desenvolvimento
O gerenciamento de riscos, conforme preconizado pelas boas práticas da área, como as do PMI, é um processo contínuo que abrange planejamento, identificação, análise (qualitativa e quantitativa), planejamento de respostas, implementação, monitoramento e reporte. Em paradas complexas, a adaptação desses princípios à realidade dinâmica e de alta pressão é fundamental. É importante que se entenda que a parada de manutenção não inicia com a execução, mas na sua concepção, engenharia e suprimentos, o que podemos caracterizar como pré-parada. Essa fase, tendo seus riscos gerenciados, aumentam as chances de sucesso da parada.

Fundamentação e Metodologias:
O gerenciamento de riscos é um sistema de alerta antecipado que permite a todos os stakeholders tomarem decisões com mais tempo e podendo buscar mais alternativas, de modo a aumentar as chances de sucesso de paradas complexas.
A fase inicial e de caráter preparatório é de planejamento. Nessa etapa é coletado o maior número possível de informações, elaborado o plano de gerenciamento de riscos, estabelecendo a periodicidade das reuniões de identificação, análise, monitoramento e reporte.
Após a fase inicial, segue-se para a identificação de riscos, que para paradas exige uma imersão profunda e multidisciplinar. Workshops com equipes de manutenção, operação, segurança, suprimentos e administrativo, aliada à análise de históricos de paradas anteriores, são essenciais para mapear desde falhas de equipamentos, problemas logísticos, atrasos de suprimentos, até desafios de segurança e coordenação de equipes. É importante que nessa fase não se busquem somente ameaças (riscos que afetam negativamente a parada), mas oportunidades (riscos que afetam positivamente a parada).
A complexidade das paradas reside também na alta interatividade e interdependência dos riscos. Em ambientes interativos, os riscos não se manifestam de forma isolada; suas causas e efeitos se entrelaçam. A análise tradicional, que examina riscos compartimentadamente, pode subestimar o impacto acumulado e as cadeias de eventos em cascata. Para lidar com essa complexidade, abordagens que considerem a dinâmica dos riscos são essenciais:

  • Análise de Rede de Riscos: Mapear as interconexões entre os riscos e as atividades do projeto, identificando os caminhos críticos de propagação de risco.
  • Modelagem de Sistemas Dinâmicos: Utilizar modelos que simulem a evolução dos riscos ao longo do tempo, considerando os feedbacks e as interações, permitindo prever comportamentos emergentes do sistema.
  • Análise de Cenários Interconectados: Desenvolver cenários complexos que envolvam múltiplas falhas ou sucessos interdependentes, avaliando o impacto combinado.
  • Workshops de Risco Multidisciplinares: Promover a colaboração entre diferentes equipes e disciplinas para identificar riscos nas interfaces e suas possíveis interações.

Após a identificação, a análise qualitativa permite priorizar os riscos com base em sua probabilidade de ocorrência e impacto potencial, utilizando-se de matrizes de risco. Nessa etapa são determinados os planos de respostas, ações que buscam alterar a probabilidade e impacto dos riscos a nosso favor. No entanto, é na análise quantitativa que a gestão de riscos atinge seu ápice de precisão para paradas complexas. Ferramentas como as Simulações de Monte Carlo são cruciais para dimensionar o impacto agregado das incertezas nos objetivos de prazo e custo do projeto. Ao simular milhares de cenários possíveis, essas ferramentas geram distribuições de probabilidade que indicam a chance real de conclusão em diferentes patamares de tempo e custo. Este processo permite determinar a contingência probabilística necessária, um buffer de prazo e custo calculado com base em dados, e não em estimativas arbitrárias, oferecendo uma visão muito mais realista da previsibilidade. Softwares como @Risk, Risky Project, Safran Risk e Primavera Risk Analysis são indispensáveis nessa etapa, assim como um Sistema de Gerenciamento de Riscos, que pode ser desde um Excel até um sistema hard code, desde que observe e atenda as necessidades da parada. Outra ferramenta que se destaca nesse processo é a Análise de Sensibilidade feita na sequência, onde essa informa quais são os riscos que mais influenciaram para o resultado da simulação. Nesse ponto salienta-se que os riscos que mais impactam os prazos podem não ser os mais altos, devido à rede de precedência e as folgas entres as atividades.

Figura 1 – Exemplo de resultado de simulação de riscos de custo

Pela sua natureza dinâmica, o monitoramento contínuo dos riscos garante que riscos já identificados sejam atualizados ou fechados e novos riscos sejam identificados. Esse processo faz parte de um ciclo semelhante ao do PDCA de cada risco. A resposta eficaz aos riscos em ambientes interativos foca não apenas no risco individual, mas na fragilidade da rede, através de estratégias como a alocação de buffers de interface e uma comunicação robusta entre as equipes para detecção precoce de problemas.
Uma etapa muitas vezes negligenciada, mas fundamental é o reporte. Essa etapa é fundamental para dar ciência dos resultados da análise de riscos aos stakeholders. Uma comunicação eficaz, transparente e dinâmica propicia uma rápida tomada de decisão de modo que à parada seja direcionada a atingir seus objetivos iniciais.

3. Resultados e Benefícios
A aplicação rigorosa e aprofundada do gerenciamento de riscos em paradas complexas, especialmente por meio de simulações probabilísticas, gera melhorias e resultados concretos e mensuráveis.

Melhorias e Indicadores:

  • Otimização de Prazos: A precisão na estimativa probabilística permite alocar recursos de forma mais eficiente e identificar gargalos potenciais antes que se tornem problemas, resultando na redução do tempo de inatividade.
  • Controle Orçamentário: A contingência calculada cientificamente assegura que recursos adequados estejam disponíveis para mitigar riscos, evitando estouros de orçamento e otimizando o fluxo de caixa do projeto.
  • Previsibilidade Aumentada: As curvas S de probabilidade fornecem uma visão clara da chance de cumprimento de prazos e custos, permitindo decisões estratégicas mais embasadas.
  • Segurança Reforçada: A identificação proativa de riscos de segurança e o planejamento de respostas minimizam incidentes e acidentes com afastamento, protegendo as equipes e os ativos.

Casos de Sucesso Reais:
Em minha trajetória profissional, a aplicação dessas metodologias resultou em benefícios significativos:

  • No projeto Miracema da TAESA, a análise de riscos com simulações de Monte Carlo foi crucial para reduzir em mais de 30 dias o tempo de startup, demonstrando como a previsibilidade pode antecipar o início da operação e, consequentemente, a geração de receita.
  • Para o projeto Biogás COPI da Raízen, a determinação da semana exata de início do fornecimento de gás foi possível graças à análise probabilística, garantindo o cumprimento de um marco contratual de alta relevância.
  • A metodologia de gerenciamento de riscos desenvolvida por mim para a Timenow, quando aplicada no projeto Braskem DNB Eteno Verde, informou com precisão a data correta para o início da parada a partir da análise da pré-parada, evitando atrasos e otimizando o cronograma geral.
  • Projetos de grande escala sob minha gestão, como o fit-out da Shell (R$ 60 milhões), foram entregues no prazo, no orçamento e sem acidentes com afastamento, enquanto o projeto MV26 da Modec (US$ 1.5 bilhão) foi concluído com impressionantes 105 dias de antecedência, ambos resultados da gestão integrada de planejamento, controle e riscos.

Esses exemplos ilustram como o gerenciamento de riscos não é apenas uma formalidade, mas uma ferramenta poderosa que otimiza processos, eleva o engajamento das equipes pela maior clareza e previsibilidade, e contribui diretamente para o sucesso e a sustentabilidade dos negócios.

Figura 2 – Exemplo de resultado da simulação em comparação com o orçamento

4. Conclusão
O gerenciamento de riscos em paradas complexas transcende a mera mitigação de problemas; ele é uma disciplina estratégica que transforma incertezas em informações acionáveis e oportunidades de otimização. Os principais aprendizados residem na compreensão de que a previsibilidade em ambientes de alta complexidade é alcançada por meio de uma abordagem sistêmica, que integra as fases de identificação, análise quantitativa (com destaque para as simulações de Monte Carlo) e um planejamento robusto de respostas. A determinação de riscos em ambientes altamente interativos exige uma mudança de paradigma da análise isolada para uma visão sistêmica. Ao entender como os riscos se interconectam e se propagam, é possível desenvolver estratégias de mitigação mais eficazes, construindo resiliência intrínseca ao projeto.

Recomendações para Replicação:
Sugere-se a adoção de metodologias de gerenciamento de riscos pautadas em dados, incentivando a capacitação das equipes no uso de ferramentas de simulação e na interpretação de seus resultados. A criação de um repositório de lições aprendidas de paradas anteriores pode enriquecer as análises futuras.

Próximos Passos e Melhorias Futuras:
A constante evolução das ferramentas de análise e a integração com inteligência artificial podem aprimorar ainda mais a precisão preditiva. O foco em uma cultura organizacional que valorize a proatividade na gestão de riscos e o compartilhamento de conhecimento é essencial para consolidar essas práticas. Ao transformar o gerenciamento de riscos em um diferencial competitivo, as organizações não apenas protegem seus investimentos, mas também impulsionam a eficiência e a excelência operacional.

5. Referências

  • PMI – Project Management Institute. A Guide to the Project Management Body of Knowledge (PMBOK® Guide). 7th ed. Project Management Institute, 2021.
  • PMI – Project Management Institute. The Standard for Risk Management in Portfolios, Programs, and Projects. Project Management Institute, 2020.
  • AACE International. AACE Recommended Practice No. 43R-08: Risk Management for Cost and Schedule Control. AACE International, 2008.
  • AACE International. AACE Recommended Practice No. 117R-21: Risk Analysis and Contingency Determination Using Expected Value. AACE International, 2021.
  • ABNT. ABNT NBR ISO 31000: Gestão de riscos — Diretrizes. ABNT, 2018.
  • SCHUYLER, John R. Risk and Decision Analysis in Projects. Project Management Institute, 2016.
  • Determinação de Risco em Ambientes Altamente Interativos: Uma Abordagem para Projetos Complexos. Project Management Institute, 2020.